Estilo vs Funcionalidade: O que podemos aprender com Persona 5?
Porque a interface ‘bagunçada’ de Persona 5 ensina mais sobre UX do que qualquer app minimalista.

O que uma pessoa desenvolvedora frontend com foco em design systems faz quando decide estudar UX/UI?
Ela baixa o Figma, compra um curso e começa a desenhar retângulos e mais retângulos. Botões arredondados, cards com sombra sutil, paletas de cor que não ofendem ninguém. É o paraíso da funcionalidade, onde cada pixel tem sua razão de existir e onde o usuário nunca, jamais, se sente perdido.
Mas aí ligo o computador, inicio Persona 5, e a tela explode numa festa visual vermelha que faz meus olhos arderem — de prazer.
O menu principal transforma bagunça em sistema, caos em identidade. Tipografia que grita. Interface que não apenas funciona, ela provoca, ela conta uma história antes mesmo que eu aperte “start”.
E então surge a pergunta que me assombra:
Por que diabos nossos apps são tão entediantes?
Esta é uma reflexão sobre o eterno dilema entre estilo e funcionalidade no design de interfaces, explorado através das lentes da obra-prima visual que é Persona 5.
Lançado pela Atlus em 2016, este JRPG sobre adolescentes que roubam corações e lutam contra a opressão social não é apenas um jogo, é um manifesto contra a tirania do minimalismo. É design punk aplicado à UX. É o que acontece quando você decide que uma interface pode ser, simultaneamente, rebelde e funcional.
Quando invisibilidade é virtude (e quando não é)
Para entender por que Persona 5 funciona onde tantos apps falham, precisamos primeiro compreender a diferença fundamental entre UI de aplicativos e UI de jogos.
“A melhor interface é aquela que você não percebe que está usando” — este princípio fundamental domina o design de aplicativos móveis e websites contemporâneos.
Esta filosofia rege o design de aplicativos móveis e websites. A UI deve ser transparente, neutra, eficiente. Ela deve antecipar suas necessidades sem jamais chamar atenção para si mesma.
O objetivo é friction zero: você abre o Uber, pede o carro e pronto.

Mas jogos operam sob uma lógica completamente diferente.
Como argumenta Anna Anthropy em “Rise of the Videogame Zinesters”: Jogos são experiências totais onde cada elemento contribui para a narrativa e imersão.
A UI não é apenas funcional, ela é diegética, ela conta história, ela constrói mundo.
Masahiro Sakurai, diretor lendário da série Super Smash Bros articula essa tensão de forma precisa em sua análise sobre design de interfaces para jogos:
“Clareza sozinha não necessariamente faz uma boa UI”.
Esta observação reconhece algo fundamental que o design de apps muitas vezes ignora existe um antagonismo natural entre clareza pura e expressividade visual.
Pense na diferença entre abrir seu app bancário e iniciar Dark Souls:
- No banco, você quer consultar saldo e fazer transferências rapidamente; a interface some para dar protagonismo às transações.Em Dark Souls, a HUD minimalista e sombria comunica desespero e isolamento antes mesmo de você encontrar o primeiro inimigo. A barra de stamina não é apenas informação é ansiedade materializada.
Katie Salen e Eric Zimmerman, em “Rules of Play: Game Design Fundamentals”, estabelecem que jogos são “sistemas de significado lúdico”. Cada elemento visual, incluindo a UI, deve servir não apenas à usabilidade, mas à experiência emocional que o jogo busca criar. É por isso que jogos podem e devem quebrar regras de UX que consideramos sagradas em outros contextos.
Sakurai complementa essa perspectiva ao enfatizar que não existe uma resposta definitiva para o dilema clareza versus estilo. A UI deve condizer com o tema e o universo do jogo, priorizando sempre a usabilidade, mas buscando ser “gentil” quando possível.
É essa gentileza que diferencia uma interface meramente funcional de uma que realmente conecta com o jogador.
O reinado do retângulo e a ditadura do Flat Design
Vivemos na era do retângulo. Abra o Figma e observe: cards retangulares, botões retangulares, modais retangulares, até os ícones foram geometrizados em quadrados perfeitos.
Somos uma civilização que decidiu que 8px de curvatura é o ápice da sofisticação visual.
Esta obsessão com formas geométricas puras tem uma origem histórica precisa: Em 2007, a Apple lançou o iPhone e com ele uma revolução estética que representou o fim do skeuomorphismo: aquelas interfaces que imitavam objetos reais, com texturas, sombras e profundidade.

O skeuomorphism dos anos 2000 era deliberadamente lúdico. O app de Notas parecia papel amarelo rasgado. A lixeira do Mac realmente parecia uma lixeira. Havia prazer tátil, havia metáfora visual, havia (ouso dizer) diversão.
Mas então a estética minimalista declarou guerra aos ornamentos. Flat design tornou-se religião. “Weniger, aber besser” (menos, mas melhor) virou mantra repetido.
O problema é que na obsessão por limpeza visual, perdemos affordances, ou seja, pistas visuais que indicam como interagir com elementos, conceito fundamental explorado por Don Norman em “The Design of Everyday Things”. Botões deixaram de parecer botões. Links perderam sublinhados. Tudo virou superfície lisa e neutra.
O flat design, levado ao extremo, criou interfaces desprovidas de personalidade e contexto. Ganhamos eficiência, mas perdemos alma. Nossos apps funcionam, mas não nos fazem sentir nada.
É aí que Persona 5 entra.
Olhar ocidental vs oriental: A estética da saturação
Para compreender por que Persona 5 funciona onde nossos apps ocidentais falham, precisamos entender diferenças culturais fundamentais na percepção visual. Observando websites japoneses vs. norte-americanos e norte-europeus, essas diferenças saltam aos olhos.
O design web ocidental, especialmente americano e norte-europeu, privilegia hierarquia clara, espaço em branco abundante e foco singular. É a estética protestante aplicada ao digital: limpo, organizado, sem excessos.
Como observa Edward Tufte em “The Visual Display of Quantitative Information”:
Nossa tradição valoriza a economia de meios: máximo impacto com mínimos elementos.

Já o design japonês, por exemplo, opera sob lógica radicalmente diferente. A estética japonesa tradicional abraça a saturação, a sobreposição, a multiplicidade de focos simultâneos. Pense em mangás: múltiplas camadas de informação visual competindo por atenção, onomatopeias explodindo por toda página, densidade que seria considerada “poluição visual” no Ocidente.
Esta diferença não é acidental; ela reflete estruturas cognitivas distintas.
Asiáticos tendem a processar informação de forma mais holística, enquanto ocidentais preferem análise focal e sequencial.
— Richard Nisbett, The Geography of Thought.
Um website japonês que parece “confuso” para olhos americanos pode ser perfeitamente navegável para usuários acostumados à densidade visual de estações de trem de Tóquio.
Um exemplo contemporâneo dessa diferença cultural se manifestou de forma inesperada durante a migração temporária de usuários ocidentais do TikTok para o RedNote (小红书), aplicativo chinês híbrido entre Instagram e TikTok.
Como observa Kristina Volchek em sua análise sobre design cultural, o RedNote apresenta uma interface mais carregada e densa, que reúne mais informações logo de início, contrastando drasticamente com a simplicidade limpa do Instagram. Mas algo surpreendente aconteceu: usuários ocidentais se adaptaram.
Esta adaptabilidade desafia uma premissa fundamental do design ocidental que usuários precisam necessariamente de minimalismo para funcionar eficientemente em espaços digitais.
A experiência RedNote provou que pessoas são mais adaptáveis que imaginamos, e talvez nossa definição de “boa UX” seja mais flexível do que pensávamos.
Em sociedades de alto contexto cultural, onde cada píxel de tela precisa comunicar múltiplas camadas de significado social e contextual, o minimalismo ocidental pode ser interpretado como frieza ou até rudeza.
O minimalismo torna-se um luxo que muitas culturas simplesmente não podem se dar ao luxo de adotar.
Como documenta Marcia Dellarosa em sua reflexão sobre design japonês após uma viagem ao país: existe uma filosofia de “empatia em escala” que permeia a criação de sistemas.
Não se trata apenas de eficiência operacional, mas de sistemas que antecipam problemas em vez de apenas reagir a eles.
É “design para o fluxo, não apenas para a entrega”, uma abordagem que prioriza a experiência emocional total do usuário.
Persona como síntese e subversão
É dentro deste contexto que Persona 5 emerge como síntese brilhante entre sensibilidades orientais e ocidentais, criando algo que transcende ambas. Mas para entender sua genialidade, precisamos primeiro olhar para seu antecessor.
Persona 3, lançado em 2006, apresentava uma UI dominada pelo azul. O azul de Persona 3 não foi escolha aleatória: comunica aceitação da mortalidade, contemplação do inevitável. Cada menu azul reforça a temática central do jogo: jovens confrontando a morte e encontrando significado na transitoriedade.

Persona 5, lançado uma década depois, opera subversão completa. O vermelho não é apenas uma escolha cromática, é manifesto político. Um vermelho saturado, quase violento, que grita contra a opressão.

A genialidade está na integração. A UI de Persona 5 não apenas usa vermelho e se dá como transgressora; Menus se abrem como colagens punk, tipografia que range e protesta, balões de diálogo que explodem em pontas irregulares. É como se toda a interface fosse um fanzine underground.
Esta estética não é acidental. Jamie Reid, designer gráfico dos Sex Pistols, criou nos anos 70 uma linguagem visual que Persona 5 cita deliberadamente: colagens agressivas, fontes recortadas de jornais, palavras que gritam contra a ordem estabelecida.
Como documenta Jon Savage em “England’s Dreaming”, o design punk não era apenas ornamental: era arma ideológica contra o conservadorismo britânico.

Cores, tipografia e formas não tradicionais: A revolução dos balões
A primeira vez que você vê um balão de diálogo em Persona 5, algo no seu cérebro de UX designer entra em pânico:
- Cadê o retângulo com cantos arredondados?Por que há pontas irregulares saindo em direções aleatórias?Por que a tipografia parece ter sido cortada com estilete?

A resposta está na compreensão de que forma segue função mas no caso de jogos, a função inclui comunicar personalidade, humor e contexto emocional.
Mas para entender verdadeiramente a radicalidade visual de Persona 5, precisamos examinar um elemento que poucos observam com atenção: o aplicativo de mensagens interno do jogo. É aqui que a filosofia de “quebrar todas as regras” se materializa de forma mais evidente.

Como observa Chris Horner, desenvolvedor Kotlin em sua análise técnica do sistema de interfaces de Persona 5: “Persona 5 imediatamente quebra nossas regras” — e ele está certo.
O aplicativo de mensagens do jogo viola praticamente todas as convenções estabelecidas de design de interface.
Primeiro, o próprio frame da aplicação não é um retângulo limpo. Tem bordas irregulares, pontas que se projetam em ângulos inesperados, uma moldura que parece ter sido recortada à mão.
Em qualquer revisão de design tradicional, isso seria marcado como “erro” ou “inconsistência”.

Segundo, os avatares dos personagens rejeitam completamente formas geométricas simples. Cada retrato tem contornos únicos, alguns com pontas agressivas, outros com curvas assimétricas. Não há padronização, não há grid system, não há consistência visual no sentido tradicional.


Terceiro, as linhas conectoras entre avatares são propositalmente “bagunçadas”. Não são linhas retas e limpas como esperaríamos em qualquer app de mensagens real, mas elementos orgânicos que adicionam caos visual deliberado.

O exemplo mais técnico, porém, revela a genialidade subversiva do design.
Os avatares dos personagens quebram as regras fundamentais de contenção: parte da imagem fica por cima do frame (na parte superior) e parte fica dentro (na parte inferior).
Como observa Horner, “a imagem precisa ser desenhada ao mesmo tempo por cima e dentro dessa forma”.
Um pesadelo de implementação em qualquer ferramenta de design tradicional.

Imaginem tentar explicar isso para um cliente:
“Queremos que nenhum elemento seja retangular, que as imagens vazem para fora dos containers…”.
Como explica Robin Williams em “The Non-Designer’s Design Book”: tipografia nunca é neutra.
Cada fonte carrega peso emocional, contexto histórico, bagagem cultural. Times New Roman comunica seriedade institucional, Comic Sans sugere informalidade juvenil.
A tipografia “suja” de Persona 5 com suas bordas irregulares e peso variável comunica rebelião, energia adolescente, recusa a aceitar padrões.

Esta complexidade tipográfica ganha uma camada adicional quando consideramos as diferenças linguísticas. Como observa Masahiro Sakurai em sua análise sobre tamanho de texto em interfaces de jogos, idiomas como japonês conseguem transferir mais informação com menos caracteres, enquanto alfabetos latinos necessitam de mais espaço para comunicar a mesma quantidade de informação. Não considerar essas diferenças pode tornar uma UI elegante em inglês completamente ilegível quando traduzida para outros idiomas (como o próprio japonês, por exemplo).
Sakurai também destaca como efeitos visuais aplicados ao texto podem “aumentar a emoção e a expressividade além do que se espera de um texto simples”. Persona 5 materializa essa filosofia: sua tipografia não apenas informa, ela performa.

As cores operam em camadas similares de significado. Vermelho não é apenas vermelho, é vermelho específico: #E60012.
Este vermelho dialoga diretamente com o azul de Persona 3 não apenas por contraste cromático, mas por oposição filosófica. Azul é contemplação; vermelho é ação. Azul aceita; vermelho resiste. Como documenta Michel Pastoureau em “Red: The History of a Color”, vermelho sempre foi cor de revolução da Roma antiga aos movimentos socialistas do século XX.
Mas a genialidade está na execução técnica. Os designers da Atlus não simplesmente pintaram uma UI tradicional de vermelho. Eles reconstruíram a gramática visual inteira. Menus que se abrem como revistas sendo folheadas. Transições que imitam cortes de tesoura. Elementos que pulsam com urgência adolescente.

Como observa Ellen Lupton em “Thinking with Type”, boa tipografia é transparente: você lê o conteúdo, não percebe a fonte. Mas em contextos expressivos, tipografia pode e deve chamar atenção para si mesma. A tipografia de Persona 5 é personagem.
O aplicativo de mensagens interno do jogo representa a materialização máxima dessa filosofia. Cada elemento visual quebra convenções estabelecidas não por acidente, mas por design consciente.
É anti-design no melhor sentido: rejeição calculada de normas que não servem aos objetivos narrativos do projeto.
Anti-Design e a quebra de paradigmas
Quando o caos é sistema
Para compreender por que Persona 5 funciona, precisamos entender o conceito de anti-design movimento que emergiu na Itália dos anos 1960–70 como reação ao funcionalismo modernista. Designers como Ettore Sottsass e o grupo Memphis decidiram que móveis poderiam ser coloridos, excêntricos, propositalmente “errados” segundo cânones estabelecidos.

O anti-design não era ausência de design era design consciente de suas próprias convenções, disposto a quebrá-las para comunicar outras verdades. Era design que assumia posição política: contra o minimalismo burguês, contra a neutralidade apolítica, contra a ideia de que “boa forma” era sinônimo de retângulos limpos.
Persona 5 opera lógica similar. Não é interface mal projetada, é interface deliberadamente caótica para servir a propósitos narrativos específicos. A UI precisa parecer feita por adolescentes rebeldes. Se parecesse muito polida, trairia a essência do jogo.
Esta “poluição visual” proposital serve múltiplas funções:
- Função Narrativa: A interface bagunçada reflete a mente adolescente em ebulição. Protagonistas de 16 anos não pensam em grids alinhados pensam em revolução, paixão, injustiça.Função Imersiva: Cada interação com menus lembra que você está jogando como rebelde. A UI não some ela constantemente reforça sua identidade como outsider.Função Diferencial: Em mercado saturado de JRPGs com interfaces genéricas, Persona 5 se distingue visualmente antes mesmo do primeiro diálogo.
Funcionalidade através do estilo: O paradoxo Persona
Aqui chegamos ao paradoxo central: Persona 5 é simultaneamente mais estiloso e mais funcional que a maioria dos apps que usamos diariamente. Como isso é possível?
A resposta está na compreensão de que funcionalidade não se limita à eficiência mecânica. Como argumenta Jesse James Garrett em “The Elements of User Experience”, experiência do usuário engloba cinco camadas:
- Estratégia,Escopo,Estrutura,Esqueleto, eSuperfície.
A maioria dos apps se concentra nas três primeiras; Persona 5 domina todas as cinco.
Na camada de estratégia, o jogo sabe exatamente o que quer comunicar: rebeldia jovem contra opressão. Na camada de superfície, cada píxel serve a esta estratégia. Não há elemento decorativo puro: tudo funciona semioticamente.
Compare com apps típicos, que otimizam para métricas quantificáveis (tempo de tarefa, taxa de conversão, bounce rate) mas ignoram impacto emocional. Um botão azul #007AFF pode ser estatisticamente mais clicável que vermelho #FF0000 — mas não comunica rebeldia.
Eficiência sem alma é funcionalidade incompleta.
Como observa Marc Hassenzahl em “Experience Design: Technology for All the Right Reasons”, produtos digitais bem-sucedidos não apenas resolvem problemas eles “criam momentos significativos”. Persona 5 entende isso intuitivamente. Cada menu aberto é momento significativo. Cada transição conta história.
Esta é a lição que o design de apps precisa reaprender:
Estilo não é ornamento aplicado sobre funcionalidade. Estilo é funcionalidade quando serve aos objetivos corretos.
O vermelho gritante de Persona 5 não atrapalha usabilidade ele a potencializa, criando affordances emocionais que orientam o jogador através de sistemas complexos.
O que Persona 5 ensina ao mundo real
Seria ingênuo sugerir que todos os apps deveriam adotar estética punk.
Você quer que seu app bancário passe confiança e estabilidade, e isso exige linguagem visual diferente. Mas Persona 5 ensina lições valiosas sobre quando e como quebrar regras de UX.
1. Contexto define tudo
Apps de produtividade precisam ser neutros; apps de entretenimento podem ser expressivos. Games, redes sociais, apps criativos todos se beneficiariam de mais personalidade visual.
2. Emoção é interface
Usuários não interagem apenas com funcionalidades interagem com sentimentos.
Uma interface que evoca alegria pode ser mais “usável” que interface tecnicamente perfeita mas emocionalmente morta.
3. Rebeldia calculada
Quebrar regras de design exige dominar essas regras primeiro.
Persona 5 funciona porque seus designers sabem exatamente quais convenções estão violando e por quê.
Como argumenta John Thackara em “In the Bubble: Designing in a Complex World”, vivemos numa era de “design invisível” onde tudo funciona, nada surpreende, nada emociona. Persona 5 oferece alternativa: design que funciona e provoca, que resolve problemas e conta histórias.
Voltemos à pergunta inicial: estilo vs funcionalidade, precisamos escolher?
Em apps de uso cotidiano bancários, produtividade, e-commerce a resposta geralmente é sim.
Clareza é prioridade. Eficiência é virtude. O usuário quer completar tarefas, não contemplar estética.
Mas em jogos, onde a interface é parte da narrativa, onde cada tela deve servir não apenas à funcionalidade mas à experiência emocional, o caos estilizado pode ser mais funcional que o minimalismo. Persona 5 prova que é possível ser simultaneamente rebelde e usável, caótico e intuitivo, punk e funcional.
A lição mais importante não é sobre cor ou tipografia, é sobre coragem.
Coragem de assumir posição estética. Coragem de dizer que nem toda interface precisa parecer produto da Apple. Coragem de acreditar que usuários são seres emocionais, não apenas racionais.
Enquanto continuamos desenhando retângulos sobre retângulos no Figma, vale lembrar que do outro lado da tela há pessoas reais, com sentimentos reais, que merecem experiências que vão além da mera eficiência.
Às vezes, uma interface que faz seu coração acelerar é mais funcional que uma que simplesmente funciona.
No final, Persona 5 não ensina apenas design — ensina vida.
Ensina que é possível ser diferente sem ser disfuncional.
Que rebeldia pode ser sistema.
Que o vermelho, às vezes, funciona melhor que o azul.
E se isso não for funcionalidade verdadeira, então talvez nossa definição de funcionalidade seja pequena demais para o mundo que queremos criar.
Referências e Créditos
Créditos de Propriedade Intelectual
Persona 3, Persona 5 e todas as imagens relacionadas são propriedade da SEGA/Atlus. Este artigo é uma análise crítica para fins educacionais e não possui afiliação oficial com a empresa.
Recursos e Bases de Dados
Game UI Database: Arquivo visual de interfaces de jogos
Livros
- Anthropy, Anna. Rise of the Videogame Zinesters. Seven Stories Press, 2012.Garrett, Jesse James. The Elements of User Experience: User-Centered Design for the Web and Beyond. New Riders, 2010.Hassenzahl, Marc. Experience Design: Technology for All the Right Reasons. Morgan & Claypool Publishers, 2010.Krug, Steve. Don’t Make Me Think: A Common Sense Approach to Web Usability. New Riders, 2000.Laurel, Brenda. Computers as Theatre. Addison-Wesley Professional, 2013.Lupton, Ellen. Thinking with Type: A Critical Guide for Designers, Writers, Editors, & Students. Princeton Architectural Press, 2010.Nisbett, Richard. The Geography of Thought: How Asians and Westerners Think Differently…and Why. Free Press, 2003.Norman, Don. The Design of Everyday Things. Basic Books, 2013.Pastoureau, Michel. Red: The History of a Color. Princeton University Press, 2017.Salen, Katie & Zimmerman, Eric. Rules of Play: Game Design Fundamentals. MIT Press, 2003.Savage, Jon. England’s Dreaming: Anarchy, Sex Pistols, Punk Rock, and Beyond. St. Martin’s Griffin, 2001.St. Clair, Kassia. The Secret Lives of Color. Penguin Books, 2016.Thackara, John. In the Bubble: Designing in a Complex World. MIT Press, 2005.Tufte, Edward. The Visual Display of Quantitative Information. Graphics Press, 2001.Williams, Robin. The Non-Designer’s Design Book. Peachpit Press, 2014.
Artigos e Vídeos
- Why Japan made me rethink DesignCreative UIs with ComposeClarity vs. Style [UI]Text Size [UI]How culture shapes UX: Western vs. Asian product design
Conceitos e Movimentos:
- Movimento Memphis (Ettore Sottsass e grupo, anos 1960–70)Jamie Reid — Designer gráfico dos Sex PistolsDieter Rams — Designer industrial, princípios do bom designJony Ive — Ex-Chief Design Officer da Apple
Agradecimentos
Aos criadores e desenvolvedores da série Persona da Atlus, cujo trabalho inovador em design de interface inspirou esta reflexão. A todos os designers, pesquisadores e escritores citados neste ensaio, cujas contribuições tornam possível um diálogo mais rico sobre design e cultura visual.
Agradecimento Especial
Este artigo foi diretamente inspirado pela palestra “Creative UIs with Compose” de Chris Horner na KotlinConf 2025. A análise técnica que Horner faz da interface de Persona 5, demonstrando como cada elemento quebra as regras do design tradicional, serviu como catalisador para uma reflexão mais ampla sobre estilo versus funcionalidade em UX/UI.
Para desenvolvedoras e desenvolvedores que trabalham com interfaces, o conteúdo de Horner é especialmente valioso porque oferece uma perspectiva técnica sobre como implementar designs “impossíveis”: aqueles que desafiam convenções estabelecidas mas que, quando bem executados, criam experiências memoráveis e funcionais. Sua abordagem desmistifica a complexidade por trás de interfaces criativas, mostrando que é possível traduzir visões artísticas ousadas em código real e funcional.
A palestra demonstra como desenvolvedores podem ser parceiros criativos no processo de design, não apenas implementadores de especificações, mas colaboradores que compreendem tanto as limitações técnicas quanto as possibilidades expressivas da tecnologia. Recomendo fortemente o vídeo para qualquer pessoa da área de desenvolvimento que queira expandir sua perspectiva sobre o que é possível criar quando técnica e criatividade se encontram.
Sobre a autora
Sendo uma desenvolvedora frontend muito focada em Design Systems, meu contato com designers sempre foi maior do que com outros desenvolvedores em todos os lugares que trabalhei. Essa proximidade me fez desenvolver cada vez mais um olhar crítico sobre interfaces e experiências digitais.
Em 2025, finalmente me rendi: além de continuar sendo desenvolvedora, estou estudando para me tornar uma UX/UI designer.
Gostaria de agradecer a todos os designers com quem trabalhei ao longo da minha carreira por evocarem em mim tanta inspiração e por me mostrarem que código e criatividade não são mundos separados, mas faces da mesma moeda.
Este artigo é, em muitos sentidos, fruto dessa jornada de descoberta entre tecnologia e design.
Estilo vs Funcionalidade em UX/UI Design: O que podemos aprender com Persona 5? was originally published in UX Collective 🇧🇷 on Medium, where people are continuing the conversation by highlighting and responding to this story.
